Entrevista feita por Nilton Viana do Brasil de Fato
Nesta entrevista ao Brasil de Fato, Casaldáliga fala do “absurdo criminal de constituir a sociedade em duas sociedades de fato: a oligarquia privilegiada, intocável, e todo o imenso resto de humanidade jogada à fome, ao sem-sentido, à violência enlouquecida”. Defende que, hoje, só a participação ativa, pioneira, de movimentos sociais pode retificar o rumo de uma política de privilégio para uns poucos e de exclusão para a desesperada maioria. E adverte: o latifúndio continua a ser um pecado estrutural no Brasil e em toda Nossa América.
Brasil de Fato – Como o senhor tem visto a devastadora crise que já afeta todos os países e principalmente a classe trabalhadora?
Dom Pedro Casaldáliga – Com muita indignação e revolta; com uma sensação de impotência e ao mesmo tempo a vontade radical de denunciar e combater os grandes causadores dessa crise. Esquecemos fácil demais que a crise fundamentalmente é provocada pelo capitalismo neoliberal. Irrita ver governantes e toda a oligarquia justificando que as economias nacionais devam servir ao capital financeiro. Os pobres devem salvar economicamente os ricos. Os bancos substituem a mesa da família, as carteiras da escola, os equipamentos dos hospitais…
Eu estava comentando ontem [19 de dezembro] com uns companheiros de missão que a avalanche de demissões acabará justificando uma avalanche de assaltos, por desespero. Está crescendo cada dia mais o absurdo criminal de constituir a sociedade em duas sociedades de fato: a oligarquia privilegiada, intocável, e todo o imenso resto de humanidade jogada à fome, ao sem-sentido, à violência enlouquecida. Fecham-se as empresas, quando não conseguem um lucro voraz, e se fecha o futuro de um trabalho digno, de uma sociedade verdadeiramente humana.
Como o senhor analisa o papel dos movimentos sociais frente à atual conjuntura?
Casaldáliga – Já faz um bom tempo que, sobretudo no Terceiro Mundo (concretamente no nosso Brasil, na Nossa América), se vem proclamando por cientistas sociais e dirigentes populares que hoje só a participação ativa, pioneira, de movimentos sociais pode retificar o rumo de uma política de privilégio para uns poucos e de exclusão para a desesperada maioria. Os partidos e os sindicatos têm ainda sua vez; devem conservá-la ou reivindicá-la. Sindicato e partido são mediações políticas indispensáveis; mas o movimento social organizado, presente no dia-a-dia do povo, é sempre mais urgente, como uma espécie de “vanguarda coletiva”.
Diante deste cenário, na sua avaliação, quais são as alternativas para os pobres do mundo hoje?
Casaldáliga – A alternativa é acreditar mesmo que “Outro Mundo é Possível” e se entregar individualmente e em comunidade ou grupo solidário e ir fazendo real esse “mundo possível”. O capitalismo neoliberal é raiz dessa crise e somente há um caminho para a justiça e a paz reinarem no mundo: socializar as estruturas contestando de fato a desigualdade socioeconômica, a absolutização da propriedade e a própria existência de um Primeiro Mundo e um Terceiro Mundo, para ir construindo um só Mundo, igualitário e plural. Com freqüência respondo a jornalistas e amizades do Primeiro Mundo que somente a construção de um mundo só (e não dois ou três ou quatro) poderá salvar a humanidade. É utopia, uma utopia “necessária como o pão de cada dia”. Onde não há utopia não há futuro.
No próximo mês de janeiro o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) completa 25 anos. O senhor, como incansável defensor dos camponeses pobres e inspirador do movimento, vê hoje a luta pela terra de que maneira?
Casaldáliga – O MST completa, então, seus 25 anos de luta, de enxada, de poesia, de profecia ao pé da estrada e da rua. Segundo muitos analistas o MST está sendo o movimento popular melhor organizado e mais eficaz “de fato”. Sabe muito bem o MST que “a terra é mais que terra”, e por isso está se volcando, pertinaz, esperançado, na conquista comunitária da terra, na educação de qualidade, na saúde para todos, numa atitude permanente de solidariedade, em colaboração gratuita e fraterna com todos os outros movimentos populares.
Que mensagem o senhor diria hoje para os milhares de trabalhadores e militantes do MST espalhados por todo o país?
Casadáliga – Os 25 anos do MST são uma data a celebrar, dando graças ao povo da terra e ao Deus da terra e da vida, reafirmando os princípios que norteiam o objetivo e a prática do MST. Recordando a palavra de Jesus de Nazaré: “não podeis servir a Deus e ao dinheiro”; não podeis servir ao latifúndio e à reforma agrária. O latifúndio continua a ser um pecado estrutural no Brasil e em toda Nossa América.
O senhor tem dito que “Para um socialismo novo, a utopia continua”. Quais devem ser os caminhos (ou o caminho) para seguirmos na construção desse socialismo novo e garantir sempre que a utopia continue?
Casaldáliga – Que o MST continue a ser um abanderado desse “socialismo novo” e de uma verdadeira reforma agrária e agrícola, inserido na Via Campesina, na procura e no feitio de uma nova América. Que mantenha viva e produtiva de esperança a memória dos nossos mártires, sangue fecundo, os melhores companheiros e companheiras da caminhada. Que siga entrando, plantando, cantando, contestando, com aquela esperança que não falha porque tem inclusive a garantia do Deus da Terra, da Vida, do Amor.
Querido D. Peddro, qundo leio o que o Senhor fala e escreve tenho a mesma experiencia dos discipulos a caminho de Emaús, quando escutava o mestre lhes falar. suas palavras ecoam por um mundo justo, frateno e longe dos ditames do capitalismo.Oxalá se toda nossa igreja de latino america fosse profetica assim como o Senhor é.fiquei feliz quando lí a sua mensagem para o intereclesial das CEBs, é incrivel sua abeertura de alma acerca das mulheres, até chorei em saber que tem alguem nessa igreja que reconhece nosso papel como mulher e religiosa. saiba que desde que lhe conheci atraves dos escritos, das entrevistas tenho um grande sonho de lhe conhecer, pois me revelas o rosto amoroso de Deus. O Deus dos ppobres, dos povos indigenas, das muleres, dos negros, dos sem lugar…sou ir, fabiana reliosa caremila MISIONARIA, DO SSERTAO DA PARAIBA, TENHO TRINTA ANOS,ESTUDO SERVIÇO SOCIAL E ENDENDO BEM O QUE O SENHOR ESTÁ FALANDO SOBRE A BÁBARIE DO CAPITALISMO. GRANDE ABRAÇO FIQUE COM DEUS ESPERO QUE UM DIA ELE ME DÊ A GRAÇA DE LHE CONHECER.
CurtirCurtir
Pedro estou trabalhando em betim, e de vez enquando a saude me faz te procurar, mesmo que seja pela internet. Abraço
CurtirCurtir