“O congresso é um grito de denúncia e de anúncio de um caminho alternativo, um caminho novo”. Dom Tomás Baduíno
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) realizou de 17 a 21 de maio, em Montes Claros – MG, o 3° Congresso Nacional da Pastoral da Terra. Com o tema “Biomas, Territórios e Diversidade Camponesa”, o congresso reuniu 760 pessoas, trabalhadores e trabalhadoras de diversas categorias – indígenas, quilombolas, ribeirinhos, posseiros, assentados, acampados, agentes da CPT, bispos, padres, religiosos, religiosas e seminaristas, além de convidados de movimentos populares e pastorais.
Em entrevista ao padre Antonio Aparecido (Cido) Pereira da Rádio Nove de Julho e do O SÃO PAULO, dom Tomás Baduíno, presidente nacional da CPT, falou sobre a 3° edição do Congresso. “Este Evento é um sinal de esperança porque congrega na sua maioria, lavradores e fala pelos que não tem voz e nem vez. É a voz mais profética dos que sofrem e são perseguidos e cujo sofrimento é encoberto pela distância dos meios de comunicação ou pela omissão da polícia”, afirmou o bispo.
Dom Tomás foi um dos fundadores da CPT em 1975, e durante a entrevista revelou estar insatisfeito com o governo Lula, no que diz respeito à Reforma Agrária. “Havia uma grande expectativa, mas a opção não foi pela Reforma Agrária, foi na linha neoliberal do capitalismo, e é sabido da força que a produção do etanol tem no país, além da celulose. Em geral quem está por trás disso são multinacionais. Aquilo que é destinado à Terra e à Reforma Agrária é uma migalha comparada aos milhões que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) separa para o agronegócio. A Reforma Agrária é uma democratização da Terra, corrige a distorção histórica que vem das capitanias hereditárias, somos o 2° país de maior concentração do mundo”, desabafou o bispo que continuou.
Questionado sobre a construção da usina de Belo Monte, dom Tomás demonstrou sua indignação. “Quem paga o preço são as populações indígenas com sua própria vida. Este quadro é decepcionante. Ali é muito claro o posicionamento da Igreja que é de total afinamento com os apelos dos povos indígenas e dos ribeirinhos. No caso do Xingu, eu acho que ele já se tornou uma espécie de trincheira, o lado indígena com o apoio da Igreja e o lado do governo com o compromisso de Lula de levar a coisa até o fim, e acredito que o canteiro de obras vai ser militarizado”, finalizou.
Padre Cido questionou também sobre a participação da Igreja na luta pela Terra. “A preocupação da Igreja com a causa da Terra não morreu, mas não tem o vigor que tinha antes. A gente viu na edição deste novo documento sobre a terra que ocupou os bispos durante a Assembleia, foi uma canseira e só saiu um documento de estudo”, destacou o bispo.
O assessor bíblico da CPT no estado de São Paulo, padre Antonio Naves, durante a entrevista falou das dificuldades que os trabalhadores rurais enfrentam no estado. “São Paulo não difere dos outros estados enquanto estrutura fundiária, ou seja, a maior parte da terra está nas mãos de poucas pessoas, o que difere do estado é que aqui, a maior parte da terra boa está nas mãos do agronegócio“, afirmou o assessor que denunciou a existência do trabalho escravo.
O 3° Congresso Nacional da CPT publicou nota oficial, comprometendo-se com a formação de seus agentes para uma espiritualidade, centrada no seguimento “radical de Jesus”, comprometendo-se com a luta pela terra e pelos territórios, combatendo o latifúndio e o agronegócio, de acordo com os diversos biomas e as diversas culturas dos povos, buscando formar comunidades sustentáveis. O Congresso da CPT comprometeu-se em enfrentar “o modelo predador do ambiente e escravizador da vida de pessoas e comunidades, que está assentado em monocultivos para exportação, amparado por mega-projetos impostos a toque de caixa”, afirma a nota.
Os participantes do Congresso persistem nas lutas contra a transposição do Rio São Francisco, contra as hidrelétricas propostas para a Amazônia e combatem o trabalho escravo. Expõe ainda a necessidade de contribuir com a articulação e o fortalecimento das organizações populares, do campo e da cidade. Como gesto deste comprometimento, a CPT realiza em setembro, durante a semana da Pátria, junto ao Grito dos Excluídos, um Plebiscito Popular para limitar à propriedade da terra.
De caráter ecumênico, a 3° edição do congresso divulgou nota publica em repúdio sobre a notícia de que Taradão, um dos acusados de ser o mandante do assassinato da irmã Dorothy Stang, foi solto após 18 dias depois de ter sido condenado a 30 anos de prisão pelo crime.