
“Quando 9 mil pessoas são escorraçadas do local onde moram como se fosse uma manada de porcos e quando tudo isso é pseudo-legalizado por decisão do Poder Judiciário, então, nós temos a certeza absoluta de que esta ordem que se procura preservar é uma completa desordem, sob o aspecto cristão e aspecto humano”, disse o jurista Fábio Konder Comparato, 75, em entrevista exclusiva ao O SÃO PAULO, dia 16, na Faculdade de Direito do Largo São Francisco sobre a situação no Pinheirinho.
O jurista propôs duas medidas legislativas: alteração do Artigo 928 do Código Civil, em que se aplique o impedimento de uma reintegração por meio de liminar, com acréscimo do parágrafo: “Não haverá reintegração de posse com moradores já instalados”. Outra inclusão seria a de que o juiz que ordenar reintegração deva acompanhar pessoalmente a ocupação e responder pessoalmente pelos eventuais abusos. “Para o futuro é necessário mudar a nossa legislação no que diz respeito às ações de reintegração e manutenção de posse e também no que diz respeito à responsabilidade do juiz”, disse Comparato, referindo-se às cenas de violência na desocupação da favela do Pinheirinho, dia 22 de janeiro, na zona sul de São José dos Campos (SP).
O debate contou com a presença do senador Eduardo Suplicy (PT-SP) que relatou toda a negociação anterior à desocupação com os governos federal, estadual e municipal para a extensão do prazo para a desocupação. “Vamos apurar a responsabilidade de cada um nos episódios em que os direitos das pessoas foram inteiramente desrespeitados”, disse o senador, referindo-se à audiência pública que será realizada hoje, pela Comissão de Direitos Humanos do Senado.
Foram convidados a prestar esclarecimentos o prefeito Eduardo Cury (PSDB-SP), juíza da 6ª Vara Cível de São José dos Campos, responsável pela ordem de reintegração de posse, Márcia Loureiro, o desembargador, presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Ivan Ricardo Garísio Sartori, e o juiz Rodrigo Capes, que impediu a decisão federal que ordenava o fim da reintegração de posse.
Outro destaque do debate foi a denúncia do ex-procurador do Estado de São Paulo, Marcio Sotelo: “não há mais massa falida da Selecta, só existe Naji Nahas”. A afirmação do ex-procurador esclarece que a “massa falida” não possui dívidas trabalhistas ou outros credores, sendo portanto, Naji Nahas, o único beneficiado com a reintegração de posse do Pinheirinho. “Agora, faço uma pergunta: como é que o Executivo, a cúpula do Poder Judiciário são movimentados pelo senhor Naji Nahas?”, questionou Sotelo, que é articulador de um manifesto de juristas que está on-line (www.peticoesonline.com).
O manifesto quer levar o caso Pinheirinho à Corte Interamericana e ao Tribunal Penal Internacional. “O que ouve no Pinheirinho foi crime contra a humanidade. Crimes contra a humanidade estão previstos no estatuto de Roma, e quem tem competência para julgar é o Tribunal Penal Internacional”, concluiu o ex-procurador Sotelo.
Matéria publicada no O SÃO PAULO, edição 2889.