Pastoral defende reeducandos em SP

Grupo de Monitoramento apresenta relatório com denúncias de maus tratos

A partir de denúncias anônimas, Grupo de Monitoramento apura violação de direitos na Fundação Casa

Texto e fotos: Karla Maria

“Senhor, o diretor tinha bafo de pinga”. A denúncia é de um adolescente em conflito com a lei, internado em uma das 101 casas de internação da Fundação Casa, antiga Febem. O SÃO PAULO teve acesso ao relato junto à Pastoral do Menor da Arquidiocese de São Paulo, que junto à Ação dos Cristãos para a Abolição da Tortura (ACAT) e outras entidades, compõe o Grupo de Monitoramento em defesa de crianças e adolescentes atendidas pela fundação.

Em 2011, o grupo visitou 12 casas da fundação, e apenas em uma avaliou condições dignas de atendimento ao adolescente, a Casa São Paulo da Vila  Maria.  “Isso prova que é possível fazer um trabalho digno, mas estamos
cansados de ver a estrutura em péssima qualidade, fios desencapados, trincas, umidade, vazamentos, esgoto entupido, o menino tomando banho frio.

Esse ambiente é propício à que? A rebeliões”, disse Sueli Camargo, advogada e coordenadora da Pastoral do Menor da Arquidiocese de São Paulo. Com a  visita, além de avaliar as estruturas físicas, o objetivo é verificar todo o atendimento prestado aos adolescentes, e as entidades verificam se a  dignidade humana do adolescente está sendo respeitada. “Chegamos a uma
das unidades da zona leste, em setembro de 2011, para verificar os motivos de rebelião e lá, os adolescentes relataram acontecimentos. Quando houve  desentendimento entre funcionários e adolescentes, 24 ficaram na tranca.

Foram submetidos a spray de pimenta e banho frio, cinco adolescentes ficaram gravemente feridos e um deles ainda estava com braço enfaixado. Não jantaram, ficaram 23 horas em uma pedra fria – a cama”, disse José Nildo Alves Cardoso, advogado da ACAT e membro da Pastoral da Juventude.

Fotos apresentam espancamentos

Os depoimentos são colhidos e anexados aos relatórios, protocolados junto à direção da unidade e aos órgãos competentes: Ministério Público, Departamento de Execução da Infância e Juventude, para que providências sejam tomadas. Dois diretores já foram afastados. “Voltamos também para
evitar a represália de funcionários”, lembrou Sueli, que como advogada ouve  os adolescentes em sigilo. Sueli, avalia que houve melhorias, mas ainda há  muito ranço de presídio. “Recebi telefonema anônimo de uma das unidades que tinha um menino em cárcere privado, com apenas uma garrafa de água e vasilha para urinar, já há meses, a comida era entregue por um quadradinho,
e que alguém precisava fazer alguma coisa. Fui até lá, disse ‘sou da Pastoral do Menor da Arquidiocese de São Paulo, recebi uma denúncia e quero averiguar’”.

O que Sueli conta, remonta aos tempos da ditadura militar. “No primeiro momento, o menino (13 anos) não falou, negou tudo, mas depois ele me contou, com medo, a situação. Ele saiu algemado, de cabeça baixa e me  mostrou com o olhar, onde era o quartinho dele”. Sueli pediu para o agente abrir e constatou ali o descumprimento de direitos humanos. O diretor dessa unidade, localizada no município de Franco da Rocha foi afastado e responde um processo criminal.

Fotos acompanham os relatórios, e nelas, a marca da violência, dos  espancamentos. “É inadmissível você ver um discurso que hoje há um novo
tratamento, não há, basta ver e ouvir as denúncias”, disse Sueli. “Estamos  denunciando, defendendo a vida daqueles meninos e meninas, mas é preciso o anúncio do Evangelho. Não há missas ou visitas, ninguém reza, ou celebra nas
unidades. Vemos igrejas neopentecostais, que mexem com o lado emocional dos meninos. Já os vi, com marcas de espancamento dizendo ‘o senhor quis assim’, já pensou?”.

Matéria publicada no O SÃO PAULO, edição 2891

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