Enem, uma porta de saída do mundo do crime

Foto: Felipe Larozza
Foto: Felipe Larozza

Dos 9.500 adolescentes que cumprem medida sócio educativa nas 121 unidades da Fundação Casa no Estado de São Paulo, 838 se preparam para as provas do Exame Nacional do Ensino Médio, o Enem PPL, voltado para pessoas em privação de liberdade, que acontecerá nos dias 3 e 4, nas próprias unidades.

Mais do que uma porta de acesso às universidades, o Enem parece ser a motivação de retomada da juventude, do convívio familiar, da autoestima perdida pelos atalhos do crime, do tráfico. “O meio mais fácil que a gente encontra para ter dinheiro é roubar ou traficar mesmo”, afirma João Pedro (nome fictício), 17 anos, há seis meses na unidade de Arujá.

Para chegar até João foram atravessados portões e trancas, que lembram a estrutura de um presídio. As semelhanças não param por aí, se estendem na postura dos adolescentes, mãos voltadas para trás e olhar baixo que só se levanta para falar do futuro. “Fiquei sabendo do Enem pela professora Thâmara, ela me falou e disse que eu ia poder ganhar bolsa. Pretendo ser médico, cuidar das pessoas”, disse Luis Roberto (nome fictício), também 17 anos.

Luis gosta de escrever cartas e se pudesse escolher o tema da redação do Enem, escreveria sobre a vida dentro da unidade. “Isso aqui dá um livro, tem muitas histórias, aqui não é fácil”. Ao seu lado, João emenda “eu gostaria de escrever sobre a guerra no Rio de Janeiro, nos morros, isso daí eu sei”. Como sabe? Os amigos, o jornal e as músicas ensinaram.

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Rotina de estudos conta com apoio

Além da redação, os candidatos se preocupam com as questões e a diretora da unidade, Vilma Moreira de Oliveira Ribeirinho, ajuda diretamente com apostilas e provas de vestibulares passados. “A diretora imprimiu as provas dos anos anteriores, então a gente estuda aquelas questões depois da aula. Aqui a gente tem que estudar e fazer esses cursos, pra passar o tempo, senão a gente vai sair com a cabeça oca”, afirma Mario Henrique, 17 anos, que deseja ser administrador.

Os adolescentes têm aula regular das 7h30 às 12h30, e à tarde têm cursos de artesanato,  informática, jardinagem, leitura livre e acesso à quadra de esportes. “Fornecemos todo subsídio para que o adolescente na hora de voltar à sociedade, se encontre e encontre seu caminho”, disse a diretora Vilma.

Durante a conversa, além do apoio das famílias na decisão de estudar, um outro foi unânime, o da professora Thâmara Gumarães, que ensina biologia, química e física. “A professora explica as coisas da melhor forma. Lá fora os professores não estavam nem aí, eu não entendia nada e larguei tudo de mão. Só quando eu vim pra cá mesmo que comecei a entender melhor”, disse João concluindo “se eu continuasse naquela vida eu ia acabar morto, então eu mudei, minha cabeça, amadureci aqui”.

Publicado no Metro News e na Folha Metropolitana, dia 27 de novembro de 2013.

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