O bispo do Xingu

Texto: Karla Maria
Publicada Revista Família Cristã de julho/2012

Conhecido como Bispo do Xingu, dom Erwin Kräutler (foto), bispo da Prelazia do Xingu e  presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) denuncia: “Os cidadãos do Pará são tratados como cidadãos de segunda categoria”. À Revista Família Cristã, dom Erwin denuncia o “caos em Altamira”, resultado do início da construção da hidrelétrica de Belo Monte e dos impactos ambientais e sociais que vêm afetando a população ribeirinha e indígena. Destaca também a exploração sexual fomentada pela chegada de milhares de trabalhadores à região, a política indigenista no País e a presença e defesa dos povos indígenas, com respeito à cultura e por meio do diálogo inter-religioso.

FC – A construção de Belo Monte já começou. Qual o cenário?
Dom Erwin –
Altamira é um caos, por isso digo que somos desconsiderados, o governo usa a estratégia do fato consumado, quem grita é contra o progresso, quem se levanta não quer o desenvolvimento. Nem sequer as condicionantes previstas para serem cumpridas antes do início das obras foram cumpridas. As condicionantes de saneamento básico, de hospitais, de escolas, de segurança, de transporte, de habitação, nada disso ou quase nada aconteceu para que as obras começassem.

FC – Essa é a segunda grande migração desordenada de trabalhadores para o Pará (antes houve a exploração da Serra dos Carajás). Como o senhor avalia tal situação?
Dom Erwin –
O cidadão do Pará e do Xingu, de modo especial agora no contexto de Belo Monte, é tratado como cidadão de segunda categoria. Para nós sempre caiu e continua a cair as migalhas, e isso é um absurdo, porque o governo tem obrigação de, primeiro, ouvir a população local e de, segundo, dar o retorno para o que se arranca de lá. Eu pergunto, em que ponto melhorou educação, saúde, habitação, segurança, transportes no Pará, depois da exploração dia e noite da Serra dos Carajás? O que nós realmente recebemos em troca por Belo Monte, pelo que está sendo implantado? Nós recebemos nada mais, nada menos do que o caos.

FC – A Pastoral da Mulher Marginalizada realizou, em 2011, um seminário sobre o impacto de Belo Monte no aumento da prostituição e na exploração sexual em Altamira, o senhor já observa essa realidade?
Dom Erwin –
Altamira é um caos também nesse sentido, porque a prostituição hoje na região é em céu aberto, é terrível, e porque estão chegando milhares e milhares de homens e logicamente essas redes de prostituição, que pegam as meninas e não perguntam a idade que elas têm, as oferecem.

FC – Qual é a posição dos povos indígenas da região de Belo Monte?
Dom Erwin –
O índio não está a favor de Belo Monte, mas logicamente está a favor dos benefícios que vai receber. Para mitigar um pouco e para calar a boca dos índios, estão entupindo-os com dinheiro, benefícios de todo o tipo e jeito. Essa é uma forma de matá-los, é uma punhalada fatal no coração da cultura indígena e de sua própria organização social.

FC – O senhor sempre fez denúncias de conflitos na disputa de terras indígenas e por isso já sofreu ameaças de morte. O senhor continua andando com segurança militar?
Dom Erwin –
Há quase seis anos ando com segurança. Desde 29 de junho de 2006, estou sendo acompanhado por quatro PMs (Policiais Militares), se revezando, e não sei o que vai dar. Tenho impressão que vou levar isso até o final do meu mandato como bispo, porque eu não posso dizer que estou sendo ameaçado de novo, mas a situação agora, nesse contexto todo, é delicada.

FC – O senhor teve tratativas pessoais com o governo do então presidente Lula sobre a construção de Belo Monte? O que resultou delas? Como são as tratativas hoje, com a presidente Dilma Rousseff?
Dom Erwin –
Sim, em 2009, estive duas vezes com Lula, em 19 de março e 22 de julho. Hoje digo que o Lula mentiu para mim, porque ele, segurando-me nos braços, me disse, com todas as letras, “Olhe, nós não vamos empurrar a Belo Monte goela baixo”. E está acontecendo exatamente isso, um rolo compressor sobre nós, diálogo nunca teve. Só monólogo do governo. Até hoje quando falamos com instâncias governamentais, o governo constrói a pauta, se você coloca Belo Monte, eles mandam riscar, não tem conversa. A Dilma não conversa sobre isso, mesmo o Gilberto Carvalho (ministro da Secretaria-geral da Presidência da República), neste ponto nega o diálogo. Não fui mais lá, porque ele próprio disse que Belo Monte sairia de qualquer jeito, então o que vou conversar?

FC – Preocupação do governo…
Dom Erwin –
Não se preocupam conosco, o objetivo é desenvolvimento, simplesmente aumentar a renda, aumentar a exportação. Então, eu sustento o Pará para o resto do Brasil, para o Sul e Sudeste, para a capital federal é a província mineradora, a província madeireira, a província energética, última fronteira agrícola.

FC – Mas o diálogo teve que existir durante as audiências públicas…
Dom Erwin –
As audiências públicas foram só para inglês ver, foram uma mentira, uma encenação, um teatro vergonhoso. O povo realmente atingido não conseguiu se manifestar, e os índios não foram ouvidos, o que é previsto em constituição. Tem lei para isso, oitivas indígenas, tem que ser ouvido. Fez-me uma maquiagem, agora, uma mentira mil vezes repetida, não se torna uma verdade nunca.

FC – Como o senhor e o Conselho Indigenista Missionário avaliam a política indigenista no Brasil?
Dom Erwin –
Nada favorável aos povos indígenas, no fundo se entende o índio como estorvo, como obstáculo ao progresso. E isso não se pode falar abertamente. Nesse sistema neoliberal tudo vira mercadoria, não se tem mais um relacionamento de vida, temos que comprar, explorar e consumir. É a lei do lucro, e o índio não produz nesse sentido, então é considerado contra o progresso.

FC – O Cimi, o qual o senhor preside, completou 40 anos. Como acontece o trabalho nesse Conselho?
Dom Erwin –
O objetivo do Cimi é ser presença solidária. Não estamos com os povos indígenas para civilizar, como antigamente, nós estamos nos aproximando dos povos indígenas num profundo respeito à cultura e suas expressões culturais, de sua vida, com um profundo amor. Somos aliados a todos os povos indígenas, servidores desses povos, para que possam viver e sobreviver, tanto física, quanto culturalmente. A primeira coisa é a presença concreta, no chão da aldeia, e a segunda é a sensibilização da sociedade. Nossa função é conscientizar o povo brasileiro não indígena a respeito dos direitos dos povos indígenas e também a sociedade internacional.

FC – O Cimi respeita a cultura dos povos indígenas, e nisso está inclusa sua religiosidade. Como acontece nesse contexto a evangelização, há também tal objetivo?
Dom Erwin –
O que significa evangelizar? Porque há ideias de evangelização que para mim são reducionismos. Evangelizar de fato é anunciar a Boa Nova, não há dúvidas, anunciar Jesus Cristo, é anunciar aquilo em que acredito, mas não somente o anúncio verbal, mas também o testemunho de minha dedicação e abnegada doação da minha vida em favor dos povos indígenas.

FC – Como o senhor avalia a crítica sofrida por missionários de séculos anteriores, em relação aos métodos de evangelização?
Dom Erwin –
Não vou jogar pedras em missionários de séculos anteriores, era outra cultura, eles eram filhos de seu tempo, subjetivamente foram todos heróis, objetivamente falando desrespeitaram as culturas aborígenes. Isso temos que dizer com todas as letras. Hoje em dia, a Antropologia, a Psicologia, tudo isso evoluiu, estamos vendo a Ciência da Religião mostrar que os índios sempre tiveram religião, por isso precisamos trabalhar nas aldeias o diálogo inter-religioso.

Bispo do Xingu recebe “Nobel Alternativo“

Dom Erwin Kraütler, o bispo do Xingu

Abaixo segue na íntegra, entrevista que fiz na última sexta-feira, com dom Erwin, o bispo do Xingu.

Direto de Altarmira (PA), dom Erwin Kräutler, bispo da Prelazia do Xingu e vencedor do ‘Prêmio Nobel Alternativo 2010 de Direitos Humanos’, entregue pela fundação “Right Livelihood Award”, concedeu entrevista exclusiva ao O SÃO PAULO. Dom Erwin, também presidente do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), foi premiado graças a sua vida dedicada à defesa dos direitos humanos e ambientais dos povos indígenas. O bispo é um grande opositor da construção da hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu, em razão dos irreparáveis danos ambientais que causaria na região.

Karla Maria  – O que representa esta premiação para o senhor e em especial para a luta dos povos indígenas na defesa de seus direitos?
Dom Erwin – O prêmio me foi concedido por causa de meu empenho em favor dos povos indígenas, de seus direitos, de sua dignidade. Essa luta já dura décadas. Achei sempre uma missão específica de nossa Igreja defender esses povos, sobreviventes dos seculares massacres. Entendemos que nosso engajamento não se esgota em algumas obras de caridade e de misericórdia numa perspectiva de assistencialismo ou paternalismo. Achamos primordial incentivar as próprias lideranças indígenas a assumir seu protagonismo, escrever a sua história. Nós apoiamos e ficamos ao lado deles no que der e vier. Começamos a falar em “aliança” entre os povos indígenas e organizações da sociedade não-indígena e essa aliança deu certo até hoje.

KM O artigo 67º das Disposições Transitórias, da Constituição Federal estabelece o prazo de cinco anos, a partir da promulgação da Carta Magna (1988), para a demarcação de todas as áreas indígenas do país, de fato, isso não aconteceu. Por que?
Dom Erwin – Falta sempre a vontade política de fazer o salto qualitativo do texto constitucional para a realidade concreta. Verificamos com pesar que atitudes antiindígenas que perpassam os segmentos mais abastados de nossa sociedade estão longe de ser erradicadas. O próprio Governo Lula deu várias amostras de sua postura antiindígena. Obcecado pela ideia de acelerar o crescimento, o presidente Lula identificou os índios como “entraves” e considerou ainda “penduricalhos” os artigos da legislação ambiental pois, no entendimento do Presidente da República, estes parâmetros legais estão travando o desenvolvimento do país. Assim, nossa luta pela demarcação das terras indígenas, pelo respeito a seu modo de ser, pela defesa de sua sobrevivência física e cultural continua e, pelo que vemos, vai continuar também no futuro.

KM – Cientistas apontam a usina de Belo Monte como uma ameaça…
Dom Erwin –
Todos os cientistas e peritos de universidades brasileiras de renome nacional e internacional alertaram o governo a respeito desse monumental despropósito. Até esta data não foram ouvidos. O governo, sem dúvida, pretende construir mais outras três usinas, sacrificando com isso todo o rio Xingu e inundando ainda muito mais áreas indígenas. Será o fim dos povos do Xingu. Além disso, Belo Monte, se for construída, causará o efeito dominó de dar luz verde para centenas de outras usinas que, com absoluta certeza, destruirão a Amazônia com consequências imprevisíveis para o Brasil e o planeta Terra. A construção da Hidrelétrica Belo Monte não é uma decisão “técnica”, é mera decisão “política”, “eleitoreira”, insana, absurda, contrariando todos os parâmetros técnicos a serem levados em conta num empreendimento desta monta. O presidente Lula me disse pessoalmente no dia 22 de julho de 2009: “Dom Erwin, eu não pretendo construir um monumento de insanidade como foi Balbina” (essa aliás também construída pela Eletronorte). Parece-me que se esqueceu desta promessa. Por que Lula não quer ouvir os cientistas “de ponta” que existem neste país?

KM – Caso Dilma seja eleita, o PAC continuará e certamente não faltarão esforços para que a Hidrelétrica de Belo Monte avance, causando os desastres ambientais e sociais que o senhor mesmo aponta. Qual é sua avaliação com relação à postura do IBAMA neste contexto, e à postura do governo?
Dom Erwin – Claro que Dilma continuará com o PAC 1 e PAC 2 e sabe-se lá quantos “PACs” ainda vai inventar. Belo Monte é “cria” da Dilma enquanto Ministra de Minas e Energia, acalentada e nutrida ainda mais quando se tornou Ministra da Casa Civil. Nossa luta continua. Almejamos que finalmente o bom senso e razões de ordem técnica e não de ordem política levarão a vitória sobre uma insanidade programada. A postura do IBAMA foi, além de vergonhosa, indigna de um órgão defensor do meio-ambiente. Agiu sob pressão e isso nunca é bom para um organismo governamental. Constrange e compromete! Aliás, das mais de quarenta condicionantes que o IBAMA catalogou para conceder, no dia 2 de fevereiro de 2010, a Licença Prévia para Usina Hidrelética de Belo Monte, no Rio Xingu, nenhuma, absolutamente nenhuma foi levada em consideração até agora. Mais uma vez ficamos com a impressão de que o IBAMA se submeteu simplesmente aos ditames que recebeu de cima e cumpriu um mero ditame. Ordem dada, ordem executada!

KM – Como o senhor observa a candidatura de Marina Silva, mulher amazônida, seria uma alternativa à economia desenvolvimentista vigente?
Dom Erwin – Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima, nascida em Rio Branco, Acre! Conheço-a e respeito-a. Esteve no Xingu no exato dia em que mataram a Irmã Dorothy. Não será eleita, mas mesmo assim sacudiu na sua campanha o eleitorado brasileiro. Foi a mais corajosa em descer ao chão concreto do Brasil e fazer propostas que, quem for eleito, não poderá menosprezar. Seu esforço foi homérico, levando em conta, em termos físicos, a sua “fragilidade”. Mulher destemida, intrépida! Amazônia se orgulha de sua filha.

Lamento, no entanto, que ela renunciou ao seu cargo de Ministra do Meio Ambiente. Sei perfeitamente que ela foi escanteada e lhe foram fechadas todas as portas. Mesmo assim penso que deveria ter enfrentado o leão. A Amazônia toda teria aplaudido e apoiado seu programa, mesmo contra setores do governo e do congresso que a hostilizaram e queriam vê-la bem longe de Brasília. Ao dar as costas ao governo do “companheiro” Lula, possibilitou ser substituída pelo carioca Carlos Mink que nunca entendeu nada da Amazônia. Acabou autoriatariamente por ditar as regras ao IBAMA.

KM – Que resposta o senhor apresenta para a situação do Xingu?
Dom Erwin –
Nossa Igreja no Xingu sempre tomou posição em favor dos povos indígenas e de seus direitos. Hoje o maior desafio é a planejada Hidrelétrica Belo Monte. Lamentavelmente vários artigos constitucionais foram violados no decorrer do processo de elaboração deste projeto. Há 30 anos lutamos contra, não só a Igreja, mas, graças a Deus, também outras instituições da sociedade civil organizada. Outra resposta que damos há muito tempo na Prelazia do Xingu é a decisão tomada já nas Assembleias do Povo de Deus da década de 80, de assumirmos a defesa do meio-ambiente como uma das prioridades da nossa caminhada, entendendo que Deus não concedeu este maravilhoso mundo apenas a esta geração. Herdamos a Amazônia de nossos antepassados e somos responsáveis de “zelar” (não subjugar!) pelo lar comum (Eco-logia vem do grego: οἶκος significa “lar”), verdadeira dádiva divina pela qual devemos empenhar-nos decididamente por ser o lar de todos os povos da Amazônia, para que as futuras gerações possam também viver e sobreviver nesta região. Amazônia, a maior floresta tropical do planeta, está terrivelmente ameaçada! É a mais pura verdade e o Brasil tem que cair na real! Não se trata de ameaça à soberania. A indiscutível soberania do Brasil sobre a Amazônia implica numa responsabilidade também indiscutível de nosso país diante do mundo todo em relação à Amazônia. Jamais esqueço o grito de um índio kayapó que me fez estremecer e sentir calafrios: “O que será de nossas crianças?!”

KM-  Por que o senhor luta pelo Xingu, por estes povos?
Dom Erwin – Cheguei aqui como padre, aos 26 anos de idade. O que significa ser pastor, aprendi aqui. Entretanto, já se foram 30 anos que sou bispo desta Igreja. Afeiçoei-me ao Xingu e a seus povos e fui aceito como um deles. Assim os anseios dos indígenas, ribeirinhos, migrantes, gente da cidade e do campo também são os meus, também as suas lutas e alegrias e suas esperanças por um mundo melhor. Entendo minha missão nos parâmetros do Decreto do Vaticano II “Ad Gentes”, sobre a Atividade Missionária da Igreja: “A Igreja é enviada por Cristo para manifestar e comunicar o amor de Deus a todas as pessoas e todos os povos” (AG 10).

KM –  O prêmio de 50 mil euros já tem destino?
Dom Erwin – Em todas as suas atividades e iniciativas, a Igreja do Xingu depende, nos projetos sociais e pastorais, da ajuda de fora. Com todo o esforço empregado através do dízimo e de campanhas pontuais estamos bem longe de ter autonomia financeira. Os ricos nunca se sentem no dever de colaborar. Quem, na realidade assume compromisso financeiro com uma Igreja que é dos pobres e da classe média baixa, cada um dentro de suas limitações.Todos os anos sou obrigado a esmolar lá fora para sustentar nossa Igreja. Assim o prêmio já tem destino seguro e fixo já antes que o tenha recebido, naturalmente levando em conta a intenção da fundação “Right Livelihood Award” da Suécia que o concedeu a mim.

Licença para a construção de Belo Monte causa indignação

Luciney Martins | Dom Erwin em coletiva de imprensa, São Paulo - SP

O Instituto do Meio Ambiente – IBAMA e dos Recursos Naturais Renováveis concedeu ontem (01/02) licença prévia para a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu (PA). A licença assinada pelo presidente do IBAMA, Roberto Messias Franco, lista 40 condicionantes a serem cumpridas para que o empreendedor receba autorização para as obras.

A Notícia gerou largas críticas entre os ambientalistas e a população local. O Movimento Xingu Vivo para Sempre, manifesta-se contra a decisão do IBAMA na próxima quinta-feira (04/02), com atos simultâneos em frente ao IBAMA de Santarém, Altamira e Belém. O Conselho Indigenista Missionário – CIMI e a Igreja Católica posicionam-se contra a construção da Usina de Belo Monte, e a pessoa que personifica toda esta luta é Dom Erwin Krüatler, bispo do Xingu, que vive na região desde 1965.

Na última sexta-feira (29/01), antes da divulgação da licença prévia para a construção da usina, dom Erwin esteve em São Paulo e falou com a imprensa sobre os danos que a construção da Usina de Belo Monte trará às populações ribeirinhas e aos povos indígenas de Altamira e região Transamazônica.

Dom Erwin disse que não houve participação da população local na decisão sobre Belo Monte, pelo contrário, os povos indígenas foram impedidos de participar das audiências públicas. Ao todo foram marcadas quatro audiências, os locais de realização impediam a participação das lideranças indígenas, ribeirinhas e movimentos sociais, tendo em vista as distâncias geográficas. “Nós exigimos 27 audiências para realmente abranger a população. O povo quer falar, quer se manifestar, mas até agora nada. O Ministério Público (PA) alegou falta de legitimidade nas audiências, mas temos a amarga sensação que nem sequer foram estudadas as alegações apresentadas”, desabafou o bispo.

Em audiência com o Presidente da República, realizada em 23 de julho de 2009, dom Erwin declarou ter recebido o apoio de Lula. “Dom Erwin pode contar comigo eu não vou empurrar esse projeto goela abaixo, de quem quer que seja”, teria afirmado o presidente, segundo o bispo, que continuou. “Ele disse e então eu confio até provem o contrário, mas eu tenho a impressão de que o presidente fala e o primeiro escalão vai em outra direção, ou simplesmente faz de conta que não ouve. O diálogo está aberto, mas eu não chego mais lá, eu tenho fé em Deus que possamos nos encontrar este ano. Agora a coisa está apertada, cronologicamente falando, se de repente eles soltam esta licença, para lutar contra vai ser difícil”, alertou dom Erwin.

Questionado sobre a participação popular no Movimento em defesa do rio Xingu, dom Erwin foi claro. “Este não é um Movimento de Igreja não, eu fechei com os movimentos. Quem assumiu esta causa foram as mulheres, elas têm muito mais sensibilidade quanto às futuras gerações. O homem pensa no ganho imediato, a mulher pensa nos filhos, na geração. As mulheres são as grandes vanguardas em Altamira, mas tem vários movimentos de todos os tipos, vai além de religião. Trata-se realmente do Movimento Xingu Vivo para Sempre e de salvar a região contra uma agressão que não será mais possível remediar, uma vez começado é irreversível”, destacou o bispo.

Dom Erwin é acompanhado 24horas por policiais militares, desde que sofreu ameaças em junho de 2006. “Eu não pedi proteção, o próprio governo do estado decretou e insistiu que eu aceitasse”, alegou.

A licença prévia, liberada na última segunda-feira (01/02), é a primeira das três licenças que fazem parte do processo de licenciamento ambiental. Se cumpridas as 40 condicionantes, a próxima etapa é a licença de operação, que autoriza o início das obras. A última, a de operação, autoriza o funcionamento do empreendimento.

Segundo a Empresa de Pesquisas Energética – EPE, o custo do empreendimento será de pelo menos R$ 16 bilhões. Até agora, três das maiores empreiteiras do país demonstraram interesse em construir Belo Monte: Camargo Corrêa, Odebrecht e Andrade Gutierrez.

Durante a coletiva dom Erwin respondeu sobre a participação do IBAMA no processo. “O IBAMA tem que liberar a licença, porque está sendo pressionado se não fizer isso agora depois vem a campanha eleitoral e acabou, a preocupação do governo é de soltar este projeto”, lamenta o bispo que amanhã (03/02) participa, a convite do presidente do Instituto, Roberto Messias Franco, de uma audiência sobre a Usina de Belo Monte.