Aparecido grita e quem ouve?

Entrevistando Sr. Aparecido, nas escadarias da Sé, dia 7

Durante a cobertura do Grito dos Excluídos, dia 7 de setembro,  em São Paulo, escrevi uma matéria grande para O SÃO PAULO. Divido aqui, no Ká entre Nós, o grito de um dos cerca de 17 mil moradores em situação de rua da capital.

Naquela manhã, de sol forte, aprendi que o mais importante para o exercício do jornalismo é ouvir, ouvir e ouvir.

Sentado, nas escadarias da catedral, em cima de tudo o que possui de material na vida, senhor Aparecido da Sé, com serenidade avaliou a atuação do atual prefeito. “O Kassab tirou o trabalho dos camêlos, tirou nossos colchões, nossa comida, tira a pouca dignidade que nós temos”.

Senhor Aparecido tem 67 anos, problemas de circulação e diabetes,  mas afirma, que a sociedade e o poder público têm problemas maiores: a cegueira e a surdez.

“Sou sim discriminado, uma vez, precisei tomar o ônibus, porque minhas pernas doem com minhas varizes, e o motorista do ônibus me chamou de lixo, ele me disse ‘eu não levo lixo não, desce’. Agora como posso tomar banho em um banheiro pequeno e sujo com outras 150 pessoas”, disse referindo-se ao banheiro público que fica embaixo do Viaduto Pedroso.

Aparecido foi estudante salesiano na juventude, hove vive nas ruas, dorme na calçada do Instituto Pasteur, na avenida Paulista. Questionado porque não usa os albergues, foi categórico: “há piolhos”. Essa iformação talvez falte ao candidato à prefeitura de São Paulo, José Serra (PSDB), que em colóquio com o clero paulista, dia 20, afirmou sobrarem vagas nos albergues. Eis o motivo, candidato. talvez homens e mulheres não queiram ser tratados como animais que convivem entre as pulgas?!

Mas, o homem que recebeu o nome em homenagem à Nossa Senhora Aparecida, diz também ser discriminado em igrejas. “Não posso entrar para rezar, na Catedral só quando tem multidão. Vou à missa das 9h ou às 11h na Igreja São Luiz, lá na Paulista e assisto dos fundos”.

Aparecido “grita”, mas o governo municipal paulista parecer padecer de outros males: surdez e omissão.

18º Grito dos Excluídos questiona Estado e energia para quê e para quem?

Foto Luciney Martins | Coletiva em São Paulo sobre o Grito dos Excluídos

“Queremos um Estado a serviço da nação, que garanta direitos a toda a população”. Esse é o “grito”que percorrerá as ruas no próximo Dia da Pátria, 7 de setembro, em todo o Brasil. O anúncio foi feito em coletiva de imprensa, dia 30, por dom Guilherme Antônio Werlang, presidente da Comissão Episcopal Pastoral para o Serviço da Caridade, da Justiça e da Paz da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), na sede do Regional Sul 1 da CNBB, em São Paulo.

“Estamos percebendo que o Estado brasileiro está a serviço muito mais de interesses particulares do que de toda a nação, e o Grito quer dizer: nós somos a nação brasileira, mas o Estado não atende e não garante os direitos de toda a população”, afirmou dom Guilherme, que defende que as pessoas saíam às ruas e se mobilizem no Dia da Pátria.
Para o bispo, a sociedade civil precisa ser protagonista no processo verdadeiramente democrático e a mobilização é a arma a ser usada. “Vejamos a Lei da Ficha Limpa, anticorrupção, vejam o mensalão. Temos que lembrar que nenhuma dessas leis que está passando o Brasil a limpo, nasceu de dentro do Congresso Nacional, nasceu de iniciativas populares e são elas que estão fazendo o Brasil de fato mudar, por isso esse Grito é urgentíssimo”.

Para Paula Ribas, da Associação dos Moradores de Santa Efigênia, “o grito daquela região é contra a gentrificação no centro de São Paulo [expulsão dos pobres para enobrecimento do espaço urbano]. Temos prédios e prédios abandonados e os movinentos sociais estão reunidos para dar o uso social devido àqueles lugares”, afirma Paula, que mora na região há 37 anos.

Em janeiro deste ano, a Polícia Militar realizou a Operação Sufoco na Cracolândia, com o objetivo de oferecer tratamento aos dependentes químicos e acabar com os pontos de tráfico de drogas, mas segundo a moradora, de nada adiantou a operação. “Toda a intervenção que a polícia fez em janeiro não serviu para nada, o dependente químico não tem assistência nenhuma, só serviu para espalhar o problema”.

Outro grito em destaque nesta 18º edição são os impactos da construção da usina de Belo Monte, em Altamira, no Pará. O Grito dos Excluídos não aceita o projeto da construção da barragem e de outras obras do Programa de Aceleração do Crescimento do governo federal. Iury Paulino, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) explicou o motivo. “Estamos discutindo energia elétrica para quê e para quem? À quem essa energia vai servir, os benefícios dela são para o conjunto da população brasileira? Não, Belo Monte nada mais é, do que um instrumento das corporações”, disse Iury, referindo-se às empresas presentes no consórcio Norte Energia, responsável pela Obra de barragens pelo Brasil: o grupo Eletrobras, as empresas Neoenergia, Cemig, Light, Vale e Sinobras, o grupo J Malucelli, os fundos de pensão Petros (Petrobras), Funcef e Cevix 3.

“O modelo energético brasileiro serve para sustentar esses negócios”, disse Iury. Questionado sobre a posição da CNBB diante da construção da Usina de Belo Monte, dom Guilherme ressaltou que entre os bispos há discordâncias. “A CNBB não tem uma posição única, porque há opiniões divergentes, mas defendemos o meio ambiente e apoiamos as manifestações, exigimos a transparência [na construção das barragens]”.

Romaria a Pé da Brasilândia une forças ao Grito dos Excluídos

As CEBs – Comunidades Eclesiais de Base da Região Episcopal Brasilândia, junto à Diocese de Santo André realizarão nos dias 5, 6 e 7 de setembro a Romaria a Pé. Em sua 12° edição, a romaria caminha pelos bairros da periferia até o centro de São Paulo, denunciando as injustiças que seu povo vive e se organizando para a garantia dos direitos já conquistados.

11° Romaria a Pé
11° Romaria a Pé

A Romaria a Pé começa neste sábado (05/09), às 8h da manhã, e parte da Comunidade Deus Pai dos Humildes, que fica em Perus. Ao longo do dia, os romeiros, cerca de 120 pessoas, passarão pelas comunidades Nossa Senhora Aurora (Jaraguá), Santo Antonio de Pádua (Parque Nações Unidas), Santo Antonio de Taipas (Taipas), Santo Expedito (Jardim Damasceno), Comunidade Nossa Senhora das Dores e Cristo Ressuscitado que está localizada no Jardim Ladeira Rosa. Nesta comunidade os romeiros terão o jantar e a pernoite.

No domingo (06/09) pela manhã, a Romaria recomeça com a reza do terço na Igreja Matriz, da paróquia Nossa Senhora Aparecida de Vila Souza, com o Padre Marcio Clay Chen e a comunidade local. Depois da oração, os romeiros seguem em sentido à Paróquia Nossa Senhora das Angustia, na Vila dos Ferroviários.

Por volta das 11h, os romeiros estarão no Largo do Paissandu e de lá seguirão para Largo São Francisco, onde será servido almoço. À tarde se concentram no Pátio do Colégio e seguem para a Casa de Oração do Povo de Rua, onde será realizada uma celebração, o jantar e a pernoite. Antes porém, um breve, porém, valioso convívio com os moradores em situação de rua.

Já na segunda-feira, dia da Independência (07/09), os romeiros partem para a Catedral da Sé. Participarão da celebração das 8h da manhã e em seguida unirão seus gritos, aos demais, de toda a São Paulo e do Brasil, e caminham da Praça da Sé até o Monumento do Ipiranga.

Com o tema: Vida em primeiro lugar. A força da transformação está na organização popular, o Grito em São Paulo, está em sua 11° edição. Em nível nacional, esta é a 15° Vez que as pastorais sociais, movimentos populares, trabalhadores/as, excluídos e excluídas, se unem e gritam por melhores e dignas condições de vida, por emprego, salário, moradia, terra e a garantia dos direitos, contra a criminalização dos movimentos sociais.