Diplomada na AGL

A quarta-feira, 27, estava quente em Guarulhos, e o Lago dos Patos especialmente bonito. É ali, no entorno do lago, que fica a sede da Academia Guarulhense de Letras (AGL).

Foi também naquela quarta-feira que fui diplomada como membro efetivo da AGL ocupando a cadeira 8, cujo patrono é o jornalista, poeta, escritor Aristides Castelo Hanssen, que faleceu em 6 de março de 2020 em Guarulhos.

Fundada em 8 de dezembro de 1978, “A Academia Guarulhense de Letras tem por fim a cultura da língua, da literatura nacional e a preservação do patrimônio histórico e geográfico do município.”

Saiba um pouco mais da Academia e conheça os demais acadêmicos e sua produção literária, aliás… esta será uma das minhas grandes e saborosas missões na AGL: apresentar e difundir a literatura produzida na cidade de Guarulhos. Bora…

Tudo dói neste país ultimamente

Já escrevi uma reportagem sobre aborto que causou muita, muita dor de cabeça e insultos a mim, seja por falta de interpretação do que estava escrito na reportagem ou por falta de capacidade de as pessoas lidarem com assuntos complexos que demandam análises e comportamentos que vão além da simplista dualidade. Está no meu livro, o Mulheres Extraordinárias. Leiam…

Falar da menina que foi estuprada dói demais. Por quatro anos essa pequena foi violada. E é disso que quero falar aqui… de um pênis enfiado à força em um corpinho de seis, sete, oito, nove anos de idade. Uma, duas, três…sei lá quantas vezes ao longo de todos estes anos… imaginem essa violência física somada ao cheiro, à presença deste homem, deste monstro em sua casa, à mesa com sua família, um espaço que deveria ser de amor, acolhida, alegria. Dói escrever e deve causar repulsa ler isso… mas é disso que se trata. A violação de uma infância.

Desde pequena tive medo disso, e descobri muito recentemente que fui abusada quando era ainda menor que esta pequena. O impacto eu sinto até hoje. Pânico, medo, tristeza… Dói falar disso e dói os julgamentos. A lei está aí desde a década de 1940. Mulheres vítimas de abuso sexual e/ou que correm risco de morrer podem interromper uma gestação. Mulheres… imaginem crianças, cujos corpos não estão preparados para gerar uma vida.

Dói falar também da interrupção de uma vida e ontem, na Sé, vi algumas jogadas pelas calçadas. Não vi manifestação na porta da Prefeitura em defesa dos meninos que cheiravam cola pra enfrentar a realidade da rua. Dói. Tudo dói neste país ultimamente. E trago isso aqui para expor o criminoso que cometeu esse abuso. Ele deve ser o foco da ira de tantos, não a criança. Não a vítima. A blogueira que vazou os dados da menina deve ser processada por violar a privacidade e aumentar a tortura dessa família. Não julguem mais uma vez a mulher, criança. Não.

Aniversário de 1 ano, a gente não esquece

aniversárioO livro Mulheres Extraordinárias completou um ano nas prateleiras de nossas livrarias e estantes pelo país. Tenho um orgulho gigante desse movimento que começou com minhas andanças e reportagens e se tornou uma obra de jornalismo literário que dialoga com as mulheres e os homens sensíveis aos dilemas e durezas de nosso dia a dia.

Na última sexta-feira, 9, estive na Livraria da Paulus na Vila Mariana, em São Paulo, para bater um papo com alguns leitores e foi uma experiência muito intensa. Mulheres e homens de diferentes gerações se reuniram para falar de empatia, o poder da educação e da sororidade nas nossas vidas. Falar do papel da mulher e chegamos às nossas avós. Teve emoção.

Dei-me conta do quanto é importante a qualidade dos encontros, do ouvir, do fazer bem aquilo que se faz, do olhar no olhar. Por isso, agradeço a você que enfrentou o trânsito daquela sexta-feira para estar comigo, foi tão importante quanto estar com Ronnie Von, na quarta-feira anterior. A televisão ainda tem um poder de alcance que poucos podemos mensurar e sim fui reconhecida na rua e isso já me assustou positivamente.

Estar um ano com o livro por aí, pelo país, estimulando debates, discussões, confissões, lágrimas, reencontros, empoderamento feminino sim com toda a força que essa palavra tem, é das coisas mais maravilhosas que já pude vivenciar em minha vida. Por isso fica o agradecimento a quem acreditou, porque muitos não acreditaram e ainda torcem contra, o que é um desperdício de energia absurdo.

Obrigada Claudiano Avelino por acreditar naquilo que nem eu acreditava. Obrigada, Paulus Editora. Quero continuar por aí encontrando e conversando com mais homens e mulheres para que o jornalismo a serviço da vida continue alcançando mais e mais pessoas para que o desconhecimento e/ou a desinformação que geram ignorância e violência percam espaço para o conhecimento, a admiração, a empatia.

Obrigada a cada livraria, associação, faculdade, clube de leitura, parente, amigos e amigas, colegas jornalistas que possibilitaram esses encontros literários, encontros de vida, que mudaram minha percepção em vários aspectos. É uma força que me move, tanto que já estou escrevendo meu segundo livro, que será tema para este blog mais para o futuro.

O livro Mulheres Extraordinárias continua à venda nas livrarias da Paulus, Saraiva, Amazon, nas versões impressa e e-book.

um prêmio

Larozza

Estive em Trindade, em Goiás, para receber o terceiro prêmio de jornalismo da minha carreira. Quero me concentrar no mais recente e motivo deste post com sabor mais do que especial: o Dom Helder Câmara de Imprensa da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

A reportagem que me levou até o prêmio foi Trilhos da Vida, que escrevi depois de oito dias no interior do Maranhão apurando a realidade de pescadores, quilombolas, professores, crianças, donas de casa, gente que vive às margens da Estrada de Ferro Carajás e há décadas convive com os impactos que a exploração de minério na Serra dos Carajás e o escoamento do mesmo até o porto em São Luís causa.

Impactos como casas rachadas; assoreamento dos rios e por isso falta de peixe; professoras sem voz tentando falar mais alto que o barulho do trem e por isso crianças sem aulas; falta de sinalização e acesso na ferrovia e por isso atropelamentos; indígenas e quilombolas tendo suas terras cortadas por obras e por isso um futuro incerto aos povos originários.

A apuração da reportagem contou com o apoio da Rede Justiça nos Trilhos, uma organização que visa fortalecer as comunidades ao longo do corredor Carajás e denunciar as violações aos direitos humanos e da natureza responsabilizando Vale e Estado, prevenindo novas violações e reafirmando os modos de vida e a autonomia das comunidades nos seus territórios.

Eles como poucos e aqui destaco a figura do padre Dario Bossi, conhecem a realidade, o dia a dia, as dores dos que vivem às margens da ferrovia, e nos acompanharam pela estrada possibilitando transporte, alimentação, ombro, o contato com homens e mulheres que mudaram minha forma de ver a vida, gente como Anacleta, Rose… mulheres que coloquei inclusive em meu livro, o Mulheres Extraordinárias.

A reportagem premiada também está no livro, mas com bastidores e impressões da mulher repórter. Não há a censura editorial bem comum nas redações por diversos motivos 🙂

A Rede Justiça nos Trilhos, pois,  é responsável também por construir a esperança na vida daqueles cidadãos, de que é preciso lutar pelos nossos direitos. A comunidade de Piquiá de Baixo, com cerca de 350 famílias, sabe muito bem o que é isso, tanto que depois de décadas vivendo sob o pó da siderurgia em Açailândia, no Maranhão, de problemas sérios respiratórios, alérgicos, conseguiram um terreno para viverem com mais qualidade de vida. Um terreno um pouco mais afastado dos impactos das siderúrgicas que permanecem por lá.

Ir até o Maranhão só foi possível porque a Associação Católica de Comunicação (Signis) acreditou e viu a necessidade de denunciar tal situação tão distante dos olhos da maioria dos brasileiros, das tevês e jornais tradicionais. A reportagem foi publicada na Revista Família Cristã, onde sou repórter contratada, e compartilhada em diversas outras publicações que acreditaram na necessidade de denunciar os descasos do poder público e da empresa Vale.

Eu não fui sozinha pela estrada, ao contrário. Se nas costas estavam a mochila, ao lado, estava Felipe Larozza, o repórter-fotográfico que fez fotos tão impactantes, significativas e lindas que dispensariam minhas palavras, meu texto. Junto a nós estavam Renata Santos e Guto Stancatti, a equipe de tv que nos acompanhou e produziu um documentário para a Rede Século 21, que também foi transmitido por outras dezenas de canais com a chancela da Signis.

Este prêmio é, portanto, nosso, de muita gente que acredita na função do jornalismo de formar e informar as pessoas para o bem de uma sociedade mais justa e democrática, e o dedico aos homens e mulheres que resistem no Maranhão e no Pará aos desmandos de grandes empresas que desrespeitam legislações ambientais e os direitos humanos, em detrimento de um desenvolvimento econômico insustentável.

Dedico também à minha então editora de redação que hoje é membro da diretoria da Signis, Osnilda Lima, e aos colegas de redação: Nathan Xavier e Dagmar Oliveira, Sueli Santos dal Belo quem o revisou, Rebeca Souza Venturini, Mateus Leal que deram a forma e a cor à palavras e fotografias que trouxemos do Maranhão. Mas este prêmio é também do meu marido, Felipe Rabello, aquele cara que segurou as pontas em casa, enquanto eu percorria os quilômetros de estrada. O cara que eu amo e me encoraja a seguir fazendo jornalismo, desses de pé na realidade.

A cerimônia de entrega do prêmio foi no dia 31 de março, no Cineteatro Afipe, no dia de aniversário do Felipe. Noite mais do que especial. Recebi troféu das mãos do arcebispo primaz do Brasil e vice-presidente da CNBB, dom Murilo Sebastião Ramos Krieger. “Esses trabalhos valorizam a defesa da vida, a dignidade da pessoa humana, o sadio divertimento, a ética, enfim, valores que são não apenas do cristianismo, mas de toda a comunidade humana”, destacou  dom Krieger.

Essa premiação nos encoraja a seguir pautando a realidade dos mais pobres e excluídos que vivem nas nossas periferias. É um sinal profético também, um apelo às empresas de comunicação a estarem onde a grande mídia não está e a denunciar o abandono dos mais vulneráveis e seguir apontando sinais de resistência e esperança.

A premiação será veiculada dia 28 de abril, sexta-feira, às  21h30, pelas emissoras
Rede Aparecida, Rede Vida de Televisão, Rede Rede Canção Nova, Rede Século 21

Rede Evangelizar, Rede Nazaré, TV Horizonte e TV Tubá.

Esse Dom Helder Câmara renova minha vontade de ser repórter de all star e bloquinho na mão, da rua, da real. Obrigada a você que de verdade sorri comigo.

Vencedores dos Prêmios de Comunicação da CNBB 2017

Margarida de Prata (Cinema)
Menino 23 – Infâncias Perdidas no Brasil, de Belisário Franca
Marias, de Joana Mariani
Chico, de Irmãos Carvalho

Microfone de Prata (Rádio)
– Jornalístico
Prevenção de suicídio. É preciso falar. É possível salvar vidas, de Paula Groba/ Rádio Senado (DF).

– Religioso
Família Consagrada, de Nathalia Silva Pinto/ Rádio Imaculada Conceição (SP).

– Entretenimento
Ponto de Encontro, de Imaculada del Padre (SP).

Dom Helder Câmara (Imprensa)
– Jornal
Terra Bruta, de A. Borges e L. Nossa/O Estado de S. Paulo (SP).

– Revista
Trilhos da Vida, de Karla Maria/Revista Família Cristã (SP).

Clara de Assis (Televisão)
– Reportagem
O mundo sem cárcere, de Carlos Eduardo G. de Miranda/TV Aparecida (SP)

– Documentário
O Bento – Terra da gente
, de João Eugênio, Luiz Fernando Batista e Vinícius Portugal/TV Horizonte / Belo Horizonte (MG).

Dom Luciano Mendes de Almeida (Internet)
– Portal, sites e blogs

Só notícia boa, de Rinaldo de Oliveira e Silva (DF).
http://www.sonoticiaboa.com.br

– Iniciativas em Redes Sociais

SP Invisível, de Vinicius Lima e Andre Soler (SP).
PT-br.facebook.com/spinvisivel

– Aplicativos
Senhor do Bonfim, de Elaine Franco (SP).

Menções Honrosas
– Miguel Pereira, crítico de cinema, docente da PUC-RJ e um dos organizador do Margarida de Prata.

– Silvio Tendler, diretor de seis filmes premiados.

– Dira Paes, atriz e coprodutora de Esse homem vai morrer – Um faroeste caboclo
(Emilio Gallo, 2011).

– Rodrigo Santoro, ator em dois filmes premiados.

– Fernanda Montenegro, atriz em dois filmes premiados.

Saiu o livro Mulheres Extraordinárias

livroEle já está disponível nas nuvens e eu já me sinto nua por completo. Estou falando do Mulheres Extraordinárias, o livro que escrevi com olhar curioso e pés famintos, que percorreram lugares distantes e nem sempre bonitos.  Trata-se da união de reportagens e perfis que escrevi sobre algumas mulheres e suas realidades escondidas por este país, mulheres não ouvidas, mulheres esquecidas.

Sinto-me nua, porque nas reportagens e perfis acabei me revelando, entre uma escolha e outra, no meio da apuração e nos perrengues que só quem bota a mochila nas costas e pega a estrada sabe que acontecem, e como acontecem. Neste livro, do qual me orgulho muito, coloquei-me no lugar delas e dei minha “voz” a elas.

Mãe órfã, mulher traficada, refugiada e freira ao lado de indígenas, negras, quilombolas; mulheres em situação de rua, que luta detrás das grades. Tem Mc Soffia, tem Mãe de Maio, Mãe da Sé. Tem meninas que gostam de meninas, mulheres que apanharam e recomeçaram, mulheres belas. Tem a Bela, a vida, a resistência, o grito. Tem Guadalupe, tem Maria, te fé.

O livro está disponível no site da Paulus, editora que me fez este convite inusitado para uma repórter “da rua” e que apostou em dar voz a essas mulheres incríveis com suas dores e suas alegrias.

Não é um manual de como fazer boas reportagens. Não! Mas é uma boa leitura para os que pretendem se aventurar na reportagem. Um choque de realidade distante do glamour que existe em torno da profissão que sigo antes mesmo de ser graduada.

O preço é bem acessível, por isso deixo o convite sem constrangimentos… leia as 256 páginas ilustradas por Rebeca Venturini, leia estas mulheres e com elas as diferentes realidades socioeconômicas e culturais, os problemas e soluções que encontraram, que trilharam para seguir. Espero de coração que goste, que se constranja, que sinta indignação, compaixão e esperança. Boa leitura!

Fim de um capítulo bom

Nos últimos 2 anos e alguns meses registrei muitas e muitas histórias. Voltando às reportagens encontro alguns excessos, uma literatura meio rasa, observo em uns a falta de dados, em outros um anseio ingênuo por justiça. Letras que esperavam a maturidade desta Karla, no texto e na alma.

Visitando os inseparáveis bloquinhos de anotações – e só Deus sabe como consigo entendê-los – vejo também muitas vozes, de gente de toda sorte, cor, formação. Gente letrada, gente do povo, gente com teto, sem terra, preso, prostituta, mãe, padre, desembargador, índio, nigeriano, refugiado, gente com esperança, gente sem amanhã….

Em minhas pautas vi  desespero, fogo e morte, mas não nego: presenciei verdadeiros milagres, nascimentos, vida, Vitória! Segurei Vitória no colo e na verdade, ela permanece comigo, embora tenha virado uma estrela. Essa, talvez seja a maior graça de ser jornalista: trabalhar com a vida, que para mim é sim obra de Deus.

Ela, a vida, foi sem dúvida alguma criada para a experimentação. Assim como um texto que  surge, ambos precisam de objetivos, concatenação de ideias e também de certas divagações, de rascunhos e muita, muita borracha. No meu caso há necessidade de inspiração, transpiração e um bom par de óculos – exigência que me acompanha desde os 5 anos.

A minha vida de repórter no O SÃO PAULO foi assim de muita descoberta e muita borracha nos textos, nas perguntas e nas posturas. Aprendi ali, cercada por dois prêmios Vladmir Herzog, respirando a história recente desse país, respirando o Evangelho de Jesus Cristo, que acreditem os colegas ateus, é aula de cidadania, de humanidade.

Por isso, por tanto aprendizado, por tanto questionamento interno e alimentada pelas relações que nasceram ao longo desses anos com fontes e colegas de redação, que encerro esse capítulo feliz. Sou a mesma, talvez com mais perguntas, mas certa sim, de que muitas laudas me esperam para ouvir tantos e tantas outras pessoas, para tantas outras denúncias e boas histórias.

Aos colegas Daniel Gomes, Dudu Cruz, Edcarlos Bispo, Ellen, Elvira Freitas, Fernando Geronazzo, Izilda, Jovenal, Jucelene Rocha, Luciney Martins, Nayá Fernandes e Rafael Alberto o meu muito obrigada pelo convívio, pela troca, pelo carinho. Ao padre Antonio Aparecido Pereira e a Maria das Graças (Cassia) o meu mais profundo agradecimennto pelo voto de confiança, por apostarem em alguém que chegou com muito mais vontade do que prática jornalística.  A você que já me concedeu entrevistas e informações, que me confiou sua história, sua dor e indignação, o meu muito, muito obrigada.

Encerro esse tchau, lembrando que agora e ainda mais, nos veremos por aqui, no Ká entre Nós! É isso, frio na barriga, sonhos na cabeça e no coração, bloquinho na mão, é vida que segue.

Karla Maria