Carter: Kátia Abreu recebe 25 vezes mais dinheiro do Governo do que o MST

De Paulo Henrique Amorim *
Em dezembro de 2009, Miguel Carter concluiu o trabalho de organizar o livro ‘Combatendo a Desigualdade Social – O MST e a Reforma Agrária no Brasil.’. É um lançamento da Editora UNESP, que reúne colaborações de especialistas sobre a questão agrária e o papel do MST pela luta pela Reforma Agrária no Brasil.Esta semana, ele conversou com Paulo Henrique Amorim, por telefone.

PHA – Professor Miguel, o senhor é professor de onde?

MC – Eu sou professor da American University, em Washington D.C.

PHA – Há quanto tempo o senhor estuda o problema agrário no Brasil e o MST?

MC- Quase duas décadas já. Comecei com as primeiras pesquisas no ano de 91.

PHA – Eu gostaria de tocar agora em alguns pontos específicos da sua introdução “Desigualdade Social Democracia no Brasil”. O senhor descreve, por exemplo, a manifestação de 2 de maio de 2005, em que, por 16 dias, 12 mil membros do MST cruzaram o serrado para chegar a Brasília. O senhor diz que, provavelmente, esse é um dos maiores eventos de larga escala do tipo marcha na história contemporânea. Que comparações o senhor faria?MC – Não achei outra marcha na história contemporânea mundial que fosse desse tamanho. A gente tem exemplo de outras mobilizações importantes, em outros momentos, mas não se comparam na duração e no numero de pessoas a essa marcha de 12 mil pessoas. Houve depois, como eu relatei no rodapé, uma mobilização ainda maior na Índia, também de camponeses sem terra. Mas a de 2005 era a maior marcha.

PHA – O senhor compara esse evento, que foi no dia 2 de maio de 2005, com outro do dia 4 de junho de 2005 -apenas 18 dias após a marcha do MST- com uma solenidade extremamente importante aqui em São Paulo que contou com Governador Geraldo Alckmin, sua esposa, Dona Lu Alckmin, e nada mais nada menos do que um possível candidato do PSDB a Presidência da República, José Serra, que naquela altura era prefeito de São Paulo. Também esteve presente Antônio Carlos Magalhães, então influente senador da Bahia. Trata-se da inauguração da Daslu. Por que o senhor resolver confrontar um assunto com o outro?

MC – Porque eu achei que começar o livro com simples estatísticas de desigualdades sociais seria um começo muito frio. Eu acho que um assunto como esse precisa de uma introdução que também suscite emoções de fato e (chame a atenção para) a complexidade do fenômeno da desigualdade no Brasil. A coincidência de essa marcha ter acontecido quase ao mesmo tempo em que se inaugurava a maior loja de artigos de luxo do planeta refletia uma imagem, um contraste muito forte dessa realidade gravíssima da desigualdade social no Brasil. E mostra nos detalhes como as coisas aconteciam, como os políticos se posicionavam de um lado e de outro, como é que a grande imprensa retratava os fenômenos de um lado e de outro.

PHA – O senhor sabe muito bem que a grande imprensa brasileira -que no nosso site nós chamamos esse pessoal de PiG (Partido da Imprensa Golpista)- a propósito da grande marcha do MST, a imprensa ficou muito preocupada como foi financiada a marcha. O senhor sabe que agora está em curso uma Comissão Parlamentar de Inquérito Mista, que reúne o Senado e a Câmara, para discutir, entre outras coisas, a fonte de financiamento do MST. Como o senhor trata essa questão? De onde vem o dinheiro do MST?

MC – Tem um capítulo 9 de minha autoria feito em conjunto com o Horácio Marques de Carvalho que tem um segmento que trata de mostrar o amplo leque de apoio que o MST tem, inclusive e apoio financeiro.

PHA – O capítulo se chama “Luta na terra, o MST e os assentamentos” – é esse?

MC – Exatamente. Há uma parte onde eu considero sete recursos internos que o MST desenvolveu para fortalecer sua atuação, nesse processo de fazer a luta na terra, de fortalecer as suas comunidades, seus assentamentos. E aí estão alguns detalhes, alguns números interessantes. Porque eu apresento dados do volume de recursos que são repassados para entidades parceiras por parte do Governo Federal. Eu sublinho no rodapé dessa mesma página o fato de que as principais entidades ruralistas do Brasil têm recebido 25 vezes mais subsídios do Governo Federal (do que o MST). E o curioso de tudo isso é que só fiscalizado como pobre recebe recurso público. Mas, sobre os ricos, que recebem um volume de recursos 25 vezes maior que o dos pobres, (sobre isso) ninguém faz nenhuma pergunta, ninguém fiscaliza nada. Parece que ninguém tem interesse nisso. E aí o Governo Federal subsidia advogados, secretárias, férias, todo tipo de atividade dos ruralistas. Então chama a atenção que propriedade agrária no Brasil, ainda que modernizada e renovada, continua ter laços fortes com o poder e recebe grande fatia de recursos públicos. Isso são dados do próprio Ministério da Agricultura, mencionados também nesse capítulo. Ainda no Governo Lula, a agricultura empresarial recebeu sete vezes mais recursos públicos do que a agricultura familiar. Sendo que a agricultura familiar emprega 80% ou mais dos trabalhadores rurais.

PHA – Qual é a responsabilidade da agricultura familiar na produção de alimentos na economia brasileira?

MC – Na página 69 há muitos dados a esse respeito.

PHA- Aqui: a mandioca, 92% saem da agricultura familiar. Carne de frango e ovos, 88%. Banana, 85%. Feijão, 78%. Batata, 77%. Leite, 71%. E café, 70%. É o que diz o senhor na página 69 sobre o papel da agricultura familiar. Agora, o senhor falava de financiamentos públicos. Confederação Nacional da Agricultura, presidida pela senadora Kátia Abreu, que talvez seja candidata a vice-presidente de José Serra, a Confederação Nacional da Agricultura recebe do Governo Federal mais dinheiro do que o MST?

MC – Muito mais. Essas entidades ruralistas em conjunto, a CNA, a SRB, aquela entidade das grandes cooperativas, em conjunto elas recebem 25 vezes do valor que recebem as entidades parceiras do MST. Esses dados, pelo menos no período 1995 e 2005, fizeram parte do relatório da primeira CPI do MST. O relatório foi preparado pelo deputado João Alfredo, do Ceará.

PHA – O senhor acredita que o MST conseguirá realizar uma reforma agrária efetiva? A sua introdução mostra que a reforma agrária no Brasil é a mais atrasada de todos os países que fazem ou fizeram reforma agrária. Que o Brasil é o lanterninha da reforma agrária. Eu pergunto: por que o MST não consegue empreender um ritmo mais eficaz?

MC – Em primeiro lugar, a reforma agrária é feita pelo Estado. O que os movimentos sociais como o MST e os setenta e tantos outros que existem em todo o Brasil fazem é pressionar o Estado para que o Estado cumpra o determinado na Constituição. É a cláusula que favorece a reforma agrária. O MST não é responsável por fazer. É responsável por pressionar o Governo. Acontece que nesse país de tamanha desigualdade, a história da desigualdade está fundamentalmente ligada à questão agrária. Claro que, no século 20, o Brasil, se modernizou, virou muito mais complexo, surgiu todo um setor industrial, um setor financeiro, um comercial. E a (economia) agrária já não é mais aquela, com tanta presença no Brasil. Mas, ainda sim, ficou muito forte pelo fato de o desenvolvimento capitalista moderno no campo, nas últimas décadas, ligar a propriedade agrária ao setor financeiro do país. É o que prova, por exemplo, de um banqueiro (condenado há dez anos por subornar um agente federal – PHA) como o Dantas acabar tendo enormes fazendas no estado do Pará e em outras regiões do Brasil. Houve então uma imbricação muito forte entre a elite agrária e a elite financeira. E agora nessa última década ela se acentuou num terceiro ponto em termos de poder econômico que são os transacionais, o agronegócio. Cargill, a Syngenta… Antes, o que sustentava a elite agrária era uma forte aliança patrimonialista com o Estado. Agora, essa aliança se sustenta em com setor transacional e o setor financeiro.

PHA – Um dos sustos que o MST provoca na sociedade brasileira, sobretudo a partir da imprensa, que eu chamo de PiG, é que o MST pode ser uma organização revolucionária – revolucionária no sentido da Revolução Russa de 1917 ou da Revolução Cubana de 1959. Até empregam aqui no Brasil, como economista Xico Graziano, que hoje é secretário de José Serra, que num artigo que o senhor fala em “terrorismo agrário”. E ali Graziano compara o MST ao Primeiro Comando da Capital. O Primeiro Comando da Capital, o PCC, que, como se sabe ocupou por dois dias a cidade de São Paulo, numa rebelião histórica. Eu pergunto: o MST é uma instituição revolucionária?

MC – No sentido de fazer uma revolução russa, cubana, isso uma grande fantasia. E uma fantasia às vezes alardeada com maldade, porque eu duvido que uma pessoa como o Xico Graziano, que já andou bastante pelo campo no Brasil, não saiba melhor. Ele sabe melhor. Mas eu acho que (o papel do) MST é (promover) uma redistribuição da propriedade. E não só isso, (distribuição) de recursos públicos, que sempre privilegiou os setores mais ricos e poderosos do país. Há, às vezes, malícia mesmo de certos jornalistas, do Xico Graziano, Zander Navarro, dizendo que o MST está fazendo uma tomada do Palácio da Alvorada. Eles nunca pisaram em um acampamento antes. Então, tem muito intelectual que critica sem saber nada. O importante desse (“Combatendo a desigualdade social”) é que todos os autores têm longos anos de experiência (na questão agrária). A grande maioria tem 20, 30 anos de experiência e todos eles têm vivência em acampamento e assentamentos. Então conhecem a realidade por perto e na pele. O Zander Navarro, por exemplo, se alguma vez acompanhou de perto o MST, foi há mais de 15 anos. Tem que ter acompanhamento porque o MST é de fato um movimento.

PHA – Ou seja, na sua opinião há uma hipertrofia do que seja o MST ? Há um exagero exatamente para criar uma situação política?

MC – Exatamente. Eu acho que há interesse por detrás desse exagero. O exagero às vezes é inocente por gente que não sabe do assunto. Mas, às vezes, é malicioso e procura com isso criar um clima de opinião para reprimir, criminalizar o MST ou cortar qualquer verba que possa ir para o setor mais pobre da sociedade brasileira. Há muito preconceito de classe por trás (desse exagero).

[*Em nenhuma democracia séria do mundo, jornais conservadores, de baixa qualidade técnica e até sensacionalistas, e uma única rede de televisão têm a importância que têm no Brasil. Eles se transformaram num partido político – o PiG, Partido da Imprensa Golpista].

* Jornalista. Conversa Afiada – Máximas e Mínimas 1254 http://www.paulohenriqueamorim.com.br

Kátia Abreu, provável vice de Serra

De Bertold, CMI
A rainha dos grileiros pode tornar-se futura candidata a vice na chapa de José Serra, esta possibilidade é bastante concreta já que o DEM, o principal aliado dos tucanos, depois de perder Arruda para Polícia Federal, não abre mão de ter um candidato(a) de ponta ao lado do PSDB. Como todos sabem, Serra não manda mais em sua candidatura resta saber se ele vai esboçar alguma resistência perante esta imposição do DEM.

KÁTIA ABREU:  Senadora (DEM-TO),  Suplente na CPMI

* Formada em psicologia.
* Presidente da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), eleita em 2008 para três anos de mandato. Foi presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Tocantins (1995-2005).
* Dona de duas fazendas improdutivas que concentram 2.500 hectares de terras.
* Apresentou 23 projetos no Senado e apenas três foram aprovados, mas considerados sem relevância para o país, como a garantia de visita dos avós aos netos.
* Torrou 60% das verbas do seu gabinete com propaganda (R$ 155.307,37).
* É alvo de ação civil do Ministério Público na Justiça de Tocantins por descumprir o Código Florestal, desrespeitar povos indígenas e violar a Constituição.
* Integrante de quadrilha que tomou 105 mil hectares de 80 famílias de camponeses no município de Campos Lindos (TO). Ela e o irmão receberam 2,4 mil hectares com o golpe contra camponeses, em que pagaram menos de R$ 8 por hectare.
* Documentos internos da CNA apontam que a entidade bancou ilegalmente despesas da sua campanha ao Senado. A CNA pagou R$ 650 mil à agência de publicidade da campanha de Kátia Abreu.

Projeto de Lei de Conversão 09 (PLV 09/2009) promete legalizar grileiros

“a lógica do crescimento econômico a qualquer custo vem solapando o compromisso político de se construir um modelo de desenvolvimento socialmente justo, ambientalmente adequado e economicamente sustentável”. ambientalistas contra a aprovação do PLV 09/2009

Na semana do meio ambiente e após a aprovação no Senado da medida que permite à União transferir terras na Amazônia sem licitação, ambientalistas divulgaram uma nota pública repudiando os rumos atuais da política ambiental brasileira dos poderes Executivo e Legislativo.

O texto aprovado pelo Senado na noite de quarta (3) trata da regularização fundiária da Amazônia e permite à União doar ou vender, sem licitação, terrenos de até 1.500 hectares na Amazônia Legal (Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins e parte do Maranhão). Ao todo, a União poderá legalizar 67,4 milhões de hectares. Segundo a nota divulgada pelos ambientalistas, a aprovação da medida “abriu a possibilidade de se legalizar a situação de uma grande quantidade de grileiros, incentivando, assim, o assalto ao patrimônio público, a concentração fundiária e o avanço do desmatamento ilegal”.

Com relatoria da senadora Kátia Abreu (DEM-TO), representante da bancada ruralista, o Projeto de Lei de Conversão 09 (PLV 09/2009) foi aprovado no Senado sem alterações ao texto aprovado em maio na Câmara dos Deputados. Lá, o texto tramitou inicialmente como medida provisória 458 (MP 458/09). Ao sofrer alterações antes de ser aprovada, a medida se transformou no PLV 09 e foi encaminhada ao Senado. “Essa aprovação já era esperada, é um tipo de medida que tanto a base do governo apóia, como a oposição, que é onde está a bancada ruralista. Mesmo assim, a gente ficou surpreso com os obstáculos que a medida teve no Senado, coisa que a gente não viu na Câmara.

A [senadora] Marina Silva pressionou e o placar de algumas votações foi bastante acirrado”, avaliou Raul do Valle, advogado do Instituto Socioambiental (ISA). Também contrária à PLV, a senadora Marina Silva (PT-AC) pediu em carta enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva o veto de três artigos do texto aprovado pelo Senado, denominado por ela como “legalização da grilagem“.

Um dos vetos propostos pela senadora tenta impedir a grilagem de terras ou que latifundiários consigam se apropriar de terrenos através de laranjas. A senadora defende que pessoas que não ocupam diretamente as terras não devem ser beneficiadas. Pela lei aprovada, empresas que ocuparam terras públicas até 2004 terão direito às propriedades. Imóveis médios e grandes poderão ser revendidos três anos após a concessão dos títulos; e imóveis pequenos, após dez anos. A parlamentar é contra a venda dos terrenos menos de dez anos após a sua regularização.

O segundo veto é contra a dispensa de vistoria em áreas com até quatro módulos fiscais (em média 304 hectares) antes da concessão das terras. Para a senadora, terrenos com essa dimensão também podem apresentar irregularidades, como a presença de laranjas. A terceira sugestão de veto refere-se à regularização de terras para as pessoas jurídicas que possuam outras propriedades rurais. A parlamentar justifica que um proprietário de várias empresas poderá regularizar 1,5 mil hectares como pessoa física e a mesma quantia por cada empresa que possua.

A crítica dos ambientalistas não se restringe ao projeto aprovado pelo Senado. A nota divulgada aponta oito pontos críticos da política ambientalista adotada pelos poderes Executivo e Legislativo. Dentre eles, está a modificação, em novembro do ano passado, do decreto que exigia o cumprimento da legislação florestal (Decreto 6514/08). “O Governo Federal cedeu pela primeira vez à pressão do lobby da insustentabilidade”, afirma a nota. Para os ambientalistas, as medidas recentes dos dois poderes “demonstram claramente que a lógica do crescimento econômico a qualquer custo vem solapando o compromisso político de se construir um modelo de desenvolvimento socialmente justo, ambientalmente adequado e economicamente sustentável”.

fonte: Adital