Festa na Raposa Serra do Sol

Arquivo revista Missões

Anna Pata’Anna Yan – Nossa Terra, Nossa Mãe”: Vitória dos Netos de Makunaimî. De 15 a 20 de abril a comunidade indígena Maturuca, região das Serras, coração da Raposa Serra do Sol comemora a homologação de suas terras, um processo que durou 34 anos e obteve êxito graças à organização dos povos indígenas e o apoio de amigos e missionários da Consolata.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que em 15 de abril 2005, assinou o decreto atribuindo a área de 1.743.089 hectares às 164 comunidades indígenas da região, já confirmou sua presença no dia 19 de abril.

Após o decreto ter sido assinado em 2005, foi dado o prazo de um ano para a saída dos fazendeiros e arrozeiros da área, contudo, foram necessários mais quatro anos para que todos saíssem definitivamente.

Para Aldenir Cadete, wapichana, assessor de imprensa da Raposa Serra do Sol, esta festa aguarda milhares de pessoas que participaram de todo o processo e será um momento histórico para todos os povos indígenas do Brasil. “Não se trata apenas de uma festa de comemoração, mas sim de um momento para relembrar e gravar na memória dos nossos povos a luta que tivemos para fazer valer os nossos direitos garantidos por lei e, ainda, planejar o futuro dos povos indígenas que ali habitam”, ressaltou Aldenir.

Os Missionários da Consolata participaram ativamente de todo o processo. Abaixo segue depoimento de Fernando Rocha, Superior do Instituto Missinários da Consolata, da Região Amazônia.

.”Sinto a alegria de um povo que sempre acreditou em lutar pelos seus direitos”, afirma o missionário da Consolata. Um povo que tinha uma fraca auto-estima, mas que se entregou plenamente a uma luta de mais de trinta anos. Alguns guardam cicatrizes desse tempo. “Ainda hoje carrego as marcas do que tive de fazer para defender a minha própria terra”, dizem os índios.

9° FSM Belém - PA com o Aldenir Cadete, wapichana

Os missionários da Consolata foram preciosos “aliados” que acompanharam a história das comunidades indígenas da Raposa Serra do Sol, no norte do Brasil. Mantiveram-se presentes nos bons e maus momentos.

“Eles descobriram que a força vinha não só da sua própria vontade, mas também da presença de Deus que caminha com eles e está a seu lado”, afirma Fernando Rocha. Para os índios, o momento representa a sua capacidade de resistência e conquista do direito à terra. Uma vitória única no Brasil: “Um povo que, aos olhos do poder político e económico não contava nada, mas conseguiu reverter a situação. Ao ponto de hoje ter a sua terra reconhecida e poder celebrá-lo”.

A festa da homologação da reserva – Raposa Serra do Sol – lembra também a ajuda preciosa de parceiros. Pessoas e entidades que colaboraram com a causa indígena, através da assinatura de abaixo-assinados ou aderindo a projectos. Foi um “trabalho de multidão”, explica o sacerdote de 46 anos. “Há mão de tanta gente, por vezes desconhecida, que foi capaz de ser solidário com este povo e reconhecer os seus direitos”.

A luta dos índios foi renhida. Contou com muitos opositores, em particular na região de Roraima. Pessoas, manipuladas pelos detentores do poder, que acreditavam em alegações falsas sobre os índios. Dizia-se que a homologação iria impedir o crescimento económico de Roraima. Especulava-se sobre a falta de emprego, aumento da violência, criminalidade, entre outras coisas. «Há toda uma geração que foi formada e até marcada por todo o tipo de mentiras e calúnias que sempre houve em relação aos povos indígenas em Roraima», lembra. Um facto que só o tempo pode alterar.

Ainda hoje há «vozes discordantes», mas nota-se uma grande evolução nas mentalidades. «O povo já tem outra consciência». As pessoas perceberam que muito do que se dizia não era verdade. As informações prestadas pela rádio e o jornal da diocese de Roraima também contribuem para esta mudança. «Permitem mostrar a outra visão, a outra face dos acontecimentos». A cobertura mediática do evento até surpreende o missionário, que trabalha há 16 anos na região. Os meios de comunicação social falam da festa de uma forma bastante positiva e apresentam-na como «um momento fulminante». «Para mim foi outra vitória que nós conseguimos», conclui Fernando Rocha.

A conquista da Raposa Serra do Sol

“Já acabou de passar o índio para trás, já acabou de passar o índio na escravidão, já acabou o índio de viver na miséria, na migalha, isso não existe mais. Tem que colocar uma política mais séria para os povos indígenas”. Dionito de Souza em entrevista no 9° FSM, em Belém, PA.

durante o 9° FSM, Belém do Pará. foto de Karla Maria
durante o 9° FSM, Belém do Pará. foto de Karla Maria

A Raposa Serra do Sol, após 30 anos de muitas lutas e mortes, conseguiu a demarcação contínua de suas terras. Segue abaixo a carta do Dionito José de Souza, Coordenador Geral do CIR, o Conselho Indígena de Roraima, em agradecimento a todos, que vestiram a camisa da Raposa Serra do Sol:

A Carta

O Conselho Indígena de Roraima (CIR), em nome de todas as comunidades da Raposa Serra do Sol e do Estado de Roraima, vem a público registrar o seu contentamento pela conclusão do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF), da constitucionalidade da demarcação administrativa da referida terra indígena.

Para os povos indígenas de Roraima e de todo o Brasil, a decisão dos Ministros da Suprema Corte, coloca um ponto final num conflito que arrasta-se há mais de 30 anos e tornou-se caso emblemático da política indigenista nacional.

Reconhecer a demarcação em terras contínuas da Raposa Serra do Sol é garantir a vida física e cultural dos povos macuxi, wapichana, ingarikó, taurepang e patamona, habitantes ancestrais do norte do Brasil. Os índios da Raposa Serra do Sol, cidadão brasileiros culturalmente diferenciados, depositam toda a sua confiança no Estado Democrático de Direito e na Constituição da República Federativa do Brasil, que os ampara como povos detentores de direitos originários.

O CIR agradece aos Ministros do Supremo Tribunal Federal pelo julgamento, às organizações indígenas e indigenistas, e, instituições religiosas, que durante décadas acreditaram e apoiaram a luta pelo reconhecimento da terra, além das organizações do próprio Estado Brasileiro, especialmente a FUNAI, Ministério da Justiça, Ministério Público Federal e Presidência da República. Com a conclusão do julgamento, e a retirada dos ocupantes ilegais, o CIR acredita que as comunidades viverão em paz e poderão construir um futuro de desenvolvimento sustentável e harmônico com a natureza.

Parabéns a todos que acreditaram na justa luta pelo reconhecimento de Raposa Serra do Sol.

Dionito durante painel dos Missionários da Consolata, no FSM de Belém, PA. foto de Jaime Patias
Dionito durante painel dos Missionários da Consolata, no 9° FSM de Belém, PA. foto de Jaime Patias

Conheci Dionito no 9° FSM, pude ver em seus olhos,  e nos de tantos outros indígenas que lá se encontravam, que esta era uma luta por sobrevivência humana e cultural.

Ao lado da Universidade Federal Rural de Belém, havia uma escola que serviu de alojamento  para s cerca de 1350 indígenas, que participaram do fórum. Dionito estava lá e pude entrevistá-lo. Acomopanhe:

Dionito, você é coordenador do CIR – Conselho Indigenista de Roraima, qual o trabalho deste conselho?

O CIR trabalha em defesa da terra, com a saúde e educação, contra a violênvia, dizendo não à bebida alcoólica. O CIR é uma organização indígena sem fins lucrativos

 

Quantos indígenas há no Estado de Roraima?

Há 70 mil indígenas no Estado de Roraima entre eles, macuxi, wapichana, igaripó, pataman, sapará, yanomani…nós temos. Na Raposa Serra do Sol, nós temos uma população de19 mil indígenas.

 

Qual a sua expectativa quanto à decisão do Supremo Tribunal Federal, na demarcação contínua das terras da Raposa Serra do Sol?

Os povos indígenas não vão abrir mão das terras, o Supremo Tribunal Federal só tem que reconhecer o que já está na Constituição. Nós temos que ser ouvidos, somos pessoas, somos seres humanos, e precisamos conversar com o governo federal. Acreditamos que conversando, dialogando nós teremos um país mais justo e os povos terão seus direitos respeitados de fato.

 

E como se dá o convívio com os indígenas que não concordam com a demarcação contínua das terras da Raposa?

Essa é uma mentira que sai na mídia que tem indígena contra a Raposa Serra do Sol, o que existe lá são os invasores, os não indígenas, os arrozeiros que manipularam meia dúzia de indígenas, jogando uma garrafa de cachaça, dinheiro, meio quilo de arroz, aí eles se manifestam contra a Raposa Serra do Sol.

 

Como está a segurança na Raposa Serra do Sol?

A segurança não existe, a polícia estave lá no tiroteio de cinco de maio, no atentado do Paulo César, mas não fez nada.

 

entrevista de Karla Maria

Violência na Raposa Serra do Sol

O vídeo a seguir demonstra a violência e barbárie com que os povos indígenas da Raposa Serra do Sol em Roraima, vem sofrendo há anos. 

Aldenir Cadete de Lima, índio wapichama flagrou o ataque de seis invasores, liderados por Paulo César Quartiero, em maio de 2008. “Cometem atos de violência contra indígenas, queimam casas e pontes, destroem escolas, fazem ameaças e provocam devastação ambiental”, denunciou Aldenir, que é também coordenador do Projeto Audiovisual do CIR – Conselho indígena de Roraima.

Ao todo, na Raposa Serra do Sol, já ocorreram 21 homicídios, 86 ameaças de morte, 57 agressões físicas, 10 casos de violência sexual, 84 invasões de comunidades com a destruição de 90 casas, 8 roças, 3 escolas e destruição de pontes e estradas.

A Raposa Serra do Sol

A população na Raposa é de 19 mil indígenas que vivem conforme sua organização social, usos, costumes e tradições em 194 comunidades dos povos Macuxi, Taurepang, Patamona, Ingaricó e Wapichana. A União iniciou o processo de regularização em 1977 concluindo o relatório de identificação da terra em 1992. No entanto, as invasões se intensificaram com a chegada dos rizicultores.

Em 15 de abril de 2005, através do decreto presidencial de homologação, a demarcação da RSS, foi ratificada: os povos indígenas tiveram o reconhecimento formal de seus direitos originários e a garantia de uso exclusivo sobre a terra. Segundo informou Aldenir, a portaria ministerial instituiu o prazo de um ano para a saída total dos ocupantes não-índios da área. 

  

foto de Genti Qafzezi
foto de Genti Qafzezi

Um sobrevivente

 

Aldenir pode ser considerado um sobrevivente, jornalista por vocação. Registrou o ataque e agora é perseguido pelos arrozeiros de Roraima. Seu vídeo serve hoje de instrumento na luta pela demarcação das terras indígenas dos povos da Raposa.

Casado e pai , Aldenir participou do Fórum Social Mundial, registrando a participação dos indígenas. Fica aqui minha admiração por este wapichana, que vive e luta por seu povo, suas origens e tradições.

 

 fonte: Revista Missões, Aldenir Cadeti

Roraima: Supremo deve julgar dia 27 de agosto ação sobre Raposa Serra do Sol

Fonte: CIMI – Conselho Indigenista Missionário Nacional

 

 

 

 

 

 

 

 

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) devem decidir no dia 27 de agosto se a homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, permanecerá em área contínua, como definiu o Decreto de Homologação, publicado em 2005. A informação foi divulgada dia 31 de julho.

Segundo notícia da página do Supremo, no dia 27 de agosto, “o relator do caso, ministro Carlos Ayres Britto, promete levar para o Plenário umas das 33 ações ajuizadas no STF sobre a matéria.”

Em 9 de abril de 2008, o STF determinou a suspensão da operação “Upatakon 3” da Polícia Federal, que tentava retirar os ocupantes não-indígenas da reserva. A operação só poderá ser retomada depois que o STF julgar o mérito de uma Ação Popular que pede a nulidade da Portaria n. 534, de abril de 2005, que declarou os limites da terra indígena. Esta ação foi movida pelo Governo e senadores de Roraima.

Os fazendeiros que invadem a área e diversos políticos de Roraima moveram ações judiciais contra a demarcação de Raposa Serra do Sol desde o início do processo de identificação da terra. Entretanto, até hoje, todas as decisões do STF em relação a esta terra foram favoráveis à manutenção da homologação.

Os tuxauas de Raposa Serra do Sol esperam que o STF mantenha os limites da terra em área contínua. “Tudo o que precisava ser feito aqui, já foi feito. A terra está homologada, registrada. Não podem entregar nossa terra. O povo sofre muito nas mãos dos arrozeiros”, afirmou o tuxaua Jacir Makuxi.

Histórico
A terra indígena Raposa Serra do Sol fica no Nordeste de Roraima, na fronteira com Guiana e Venezuela. Na área vivem cerca de 19 mil indígenas dos povos Makuxi, Wapichana, Ingaricó, Taurepang e Patamona, em 194 comunidades. Em 15 em abril de 2005, a área foi homologada por Decreto Presidencial, com uma extensão de 1,743 milhão de hectares. Até a homologação, foram mais de 30 anos de luta para que a terra fosse reconhecida como de ocupação tradicional indígena.

Após a homologação, o governo federal passou três anos tentando negociar a retirada dos invasores de forma pacífica. A maioria saiu, mas um pequeno grupo de arrozeiros não aceitou nenhuma proposta. Em março de 2008, a PF iniciou a operação para retirar estes fazendeiros. Os invasores reagiram com ações violentas, como incêndio de pontes, bloqueio de pontes, explosões de bombas artesanais, tentativas de homicídios contra lideranças indígenas e outras ações, lideradas pelo arrozeiro Paulo César Quartiero.